Entendendo a média da vida toda
Publicado na Tribuna Livre em 17/03/2022.
Só mesmo o Tribunal Máximo de nosso País para pregar uma peça dessas em tantos aposentados. Primeiro concluíram o julgamento virtual e, com um só voto de diferença, decidiram que regra de transição só se aplica quando mais favorável, e assim, muitas aposentadorias deveriam ser recalculadas quando a média das contribuições da vida toda for maior do que a de julho de 1994 em diante. Agora, passado menos de um mês, puxam um coringa da manga, transformando o julgamento virtual em presencial, desprezando todos os votos já lançados, talvez inclusive do relator Marco Aurélio Mello, que já não é mais ministro. E assim reiniciando a votação, com grandes chances de inverter o resultado.
Vale recordar qual é a briga: a Lei 9.876/1999 alterou a base de cálculo das aposentadorias; em vez da média dos 36 últimos salários, passou a ser a “dos maiores salários-de-contribuição correspondente a oitenta por cento de todo o período contributivo”. Por influência da tecnocracia, sem qualquer sentido jurídico, a lei dispôs uma regra de transição para quem já estava no sistema previdenciário: a média seria do “período contributivo desde a competência julho de 1994”, simplesmente porque era o início do real e ficaria mais fácil efetuar as atualizações. Acontece que a regra de transição em uma emenda constitucional existe para que os trabalhadores que já estavam no sistema previdenciário não sofram todas as agruras da nova regra. Ou seja, só pode ser aplicada quando mais favorável.
Em muitos casos, os trabalhadores tinham contribuições maiores antes de julho de 1994, e, assim, teriam a média da vida toda maior. Porém, para o ajuizamento da ação é preciso provar tal alegação. E, em novembro de 2019, a EC 103 determinou que a média seria de todas as contribuições a partir da competência julho de 1994. Sem retirar os menores que representassem 20% e sem regra de transição; e, em 1999, este advogado achava que pior não ficaria…
Além da ação da média da vida toda só se aplicar ao aposentado que tiver maiores contribuições antes de julho de 1994, ainda tem a perversidade chamada decadência. Passados dez anos da concessão do benefício, não pode mais reclamar qualquer erro que possa ter acontecido. Portanto, quem se aposentou antes de março de 2012 perdeu a chance. Observando princípios do Direito Social, a decadência é maior estultícia que poderia aparecer; se o aposentado continua recebendo todo mês um valor mensal menor do que teria direito, pode até perder os saldos que fazem mais de cinco anos, essa é a prescrição, mas ter que se conformar mensalmente com o erro, é demais!
De qualquer forma, o aposentado que pretende ajuizar tal ação, além de provar que sua média das contribuições da vida toda é maior do que a que foi utilizada pelo INSS (de julho de 1994 em diante), deve ter o início da sua aposentadoria entre abril de 2012 e novembro de 2019 (EC 103).
Os tecnocratas que servem ao atual desgoverno apresentaram aos jornais um número fantasioso do que seria a despesa com essas ações. É evidente que fizeram uma projeção absurda, buscando assustar os julgadores, e o STF, com um passa-moleque vergonhoso – alterar o julgamento virtual já concluído, para um presencial, com todo mundo votando de novo –, desfaz, na prática, a decisão que tanto tinha sido comemorada em todo o país.
Esperamos que, com um pouco de decência, o STF confirme a vitória dos aposentados.