Sergio Pardal Freudenthal é advogado e professor universitário, especialista em Direito Previdenciário, atua há mais de três décadas em Sindicatos de Trabalhadores na Baixada Santista.

A esperança voltou!

E, com a esperança, voltam também nossas obrigações na reconstrução do Estado Democrático de Direito, com a devida importância ao Direito Social.

O colunista batuca essas linhas na sexta-feira, com a certeza de que hoje, segunda-feira, 03/10/2022, estaremos todos comemorando a volta da esperança.
Retorna a esperança de reconstruir o Brasil, suas instituições e o regime democrático. A luta contra o fascismo continua em todo o mundo, com graves ameaças como, por exemplo, nas últimas eleições italianas. O neoliberalismo, totalmente desmascarado com os resultados da pandemia, contribuiu para o ressurgimento do nazifascismo, com as falsas respostas nacionalistas à globalização.
Reconstruir o Direito Social, especialmente as garantias trabalhistas e previdenciárias conquistadas na Constituição Cidadã de 1988, será nossa obrigação. Revogar as últimas reformas, reconstruindo e modernizando as relações de trabalho devidamente formais, e assim recompondo também o sistema previdenciário, terá que ser a exigência do movimento sindical.
Organizar e reivindicar será a tarefa dos sindicatos e centrais sindicais, com objetivo de reconstruir as garantias. O direito trabalhista tem como função principal a defesa da parte mais fraca nas relações entre capital e trabalho. O trabalhador tem apenas a sua força de trabalho para vender; assim, a Justiça do Trabalho deve recuperar sua razão de existência, em defesa do hipossuficiente. E, da mesma forma, o sistema previdenciário e a assistência social também precisam readquirir suas obrigações.
A Previdência deve voltar a ser Social, garantindo vida digna aos segurados, abrindo vagas no mercado de trabalho e distribuindo renda por todo o país. A assistência aos mais necessitados é obrigação do Estado, dever de qualquer governo. Para recompor a economia, será preciso garantir a sobrevivência dos mais necessitados, sem esmolas. Movimentar a economia a partir dos que têm que gastar. Esse colunista repetiu muitas vezes: em momentos de crise os que tem dinheiro só guardam, não gastam nada. Quem gasta são os que precisam, comprar comida, pagar aluguel, etc.
Vale apontar as principais perversidades presentes atualmente no sistema previdenciário, especialmente com a Emenda Constitucional 103/2019. Talvez a principal maldade esteja nos cálculos dos benefícios. Todas as aposentadorias, inclusive a por invalidez, são calculadas em 60% da média para quem tiver até 20 anos de contribuição, acrescentando 2% para cada ano a partir daí. Importante lembrar que a lei de 1991 dispunha a invalidez em 80% da média e mais 1% para cada ano, ou seja, com 20 anos de contribuição teria 100% da média.
E maldade ainda maior está no cálculo da pensão por morte, recuando para a regra dos tempos da ditadura, pagando 50% da aposentadoria do falecido, com mais 10% para cada dependente. Assim, a viúva sozinha ganha 60%. A partir de 1991, passou a ser 80% mais 10% para cada dependente. Apenas em 1995 passou a ser 100% em qualquer hipótese.
Lembrando a pensão da Dona Maria, com o marido, Seu João, falecendo antes de se aposentar, com 20 anos de contribuições. Como ainda não estava aposentado, a base de cálculo seria a aposentadoria por invalidez que receberia se ficasse inválido ao invés de morrer, 60% da média. Portanto, a pensão da Dona Maria será calculada em 60% de 60%, ou seja, apenas 36%, da média contributiva. Seu João tinha trabalhado bastante, algum tempo sem o devido registro, e, com muito esforço, conquistando sua qualificação profissional, completou a média de 5 mil reais mensais. Acontece que, pelas regras atuais, Dona Maria vai ter que ser virar com R$ 1.800.
A esperança voltou, e a luta será dura, mas compensadora. Reconstruir o Estado Democrático de Direito, com a devida importância do Direito Social.