Sergio Pardal Freudenthal é advogado e professor universitário, especialista em Direito Previdenciário, atua há mais de três décadas em Sindicatos de Trabalhadores na Baixada Santista.

Esclarecer os precatórios

Essa semana muitas soluções foram anunciadas pela mídia para a dívida dos precatórios, formada com a Emenda do Calote no desgoverno. É preciso melhor esclarecer o que representam os precatórios de caráter alimentar, como as dívidas em aposentadorias e pensões ou salários de servidores públicos.

Todo mundo que entende um pouco de verbas públicas sabia que a Emenda do Calote, aprovada pelo desgoverno em 2021, causaria graves problemas em futuro próximo. Impondo um limite inconstitucional para o pagamento de precatórios, apostaram no desastre de um governo futuro, com o acúmulo de dívidas que tal Calote representaria.
Como bem dispõe a doutrina, princípios democráticos e a Constituição Federal, dívidas judiciais do poder público devem ser pagas através de ofícios precatórios, com a obrigação do pagamento no ano seguinte. E a Carta Magna destaca as verbas de caráter alimentar, como as aposentadorias e pensões. Portanto, as dívidas da Previdência Social, pra lá de sacramentadas pelos tribunais, são frutos de incompetência administrativa (ou até maldade). São decorrentes de processos judiciais, onde o INSS, por ter deixado de pagar o que deveria, foi condenado após anos de luta. É preciso insistir: são valores que teriam sido pagos com o cumprimento da lei, não representam “novas dívidas”, comprometendo o orçamento.
Em torpe campanha eleitoral, em fins de 2021, conseguiram aprovar a Emenda do Calote, inconstitucional, ilegal, imoral e mentirosa. Deixaram de pagar alguns precatórios e pagaram outros com limite de valor sem qualquer fundamentação. Com o governo legítimo, os precatórios do ano foram pagos no primeiro semestre, porém, obedecendo às normas da EC do Calote, sem regularizar os buracos do ano passado e ainda construindo novas dívidas.
Surgem várias ideias para o pagamento dos precatórios, inclusive sobre a renomeação das verbas, como “despesas financeiras” ou “gastos primários”. Falam até em utilizar para pagamentos de dívidas tributárias, mas isso não se aplica em precatórios de benefícios previdenciários. E, com o receio de não receber seus direitos, muitos aposentados e pensionistas acabam vendendo seus precatórios e perdendo bastante dinheiro.
Importante lembrar que no STF tramitam ADINs, Ações Diretas de Inconstitucionalidade, sobre tal tema. A União poderia reconhecer que o não pagamento dos precatórios alimentares é muito inconstitucional.
Todos os cálculos, mais ou menos conservadores, reconhecem que a dívida que restaria em 2027, com o cumprimento da Emenda do Calote, seria astronômica, para assustar qualquer candidato. Ou seja, será necessário acertar com urgência os rombos deste e do ano passado. Preferivelmente ainda em 2023.
Sem poupar os merecidos elogios ao Governo Lula, inclusive recompondo o glorioso INSS, que se acertem imediatamente as teses e conceitos tecnocráticos, seja para a reclassificação de despesas e gastos, seja admitindo a inconstitucionalidade no STF, é obrigação do atual governo corrigir o absurdo e pagar devidamente os precatórios alimentares desse ano e os saldos do ano passado. Repito que a falta de culpa não retira a responsabilidade.
As dívidas existem e muito bem explicadas, sem depender de integração no orçamento. E aposentados e pensionistas também tem fome, inclusive de Justiça.