As proezas de um goleiro
Artigo sobre futebol de salão e família, publicado na Tribuna Livre, em 29/09/2024.
Ainda nem tinha cinco anos e me disse: “vovô, quero jogar futsal”. O vovô gosta de esportes, bicicleta, surf e até capoeira, mas nunca joguei com bola, nem em esporte coletivo e muito menos com alguma competitividade. E Caetano ainda completou: “quero jogar no gol; eu sou bom na linha, mas sou melhor no gol”. Fui conversar no Gremetal, afinal sou advogado no Sindicato dos Metalúrgicos desde 1989 e é uma escola de futebol de salão com história. Como já era outubro, o técnico me disse, bravo: “no final do ano; afinal, em que posição ele joga?”, e quando eu disse que era goleiro, ele replicou: “é amanhã, o treino é amanhã, e se você não trouxer, eu vou buscar na sua casa”. Assim meu neto começou a jogar como goleiro de futsal.
Jogou no Gremetal, inclusive no time federado sub-8 e sub-9. Foi vice-campeão paulista e melhor goleiro, mas, quando chegou ao sub-10, não quis continuar. “Vovô, é muita disputa e eu quero mesmo é me divertir”. Assim, seguiu nas quadras, pelas escolas ou convocado por algum professor. Acontece que ele nunca ri, na quadra nem mesmo sorri; é um goleiro sério e ainda por cima faz gols. Atua como o denominado goleiro-linha, defende e bate pênaltis.
Nas penalidades máximas ele tem muitas histórias. Em uma final de campeonato, após o empate, decide-se nos pênaltis, três para cada lado. Vale explicar o resultado um a zero, com meu herói no gol. O adversário bateu primeiro e o Caetano pegou; nosso jogador fez o primeiro gol; a segunda batida do adversário e o goleiro de novo pegou; nosso batedor jogou para fora; e o último adversário a bater o pênalti tinha nos olhos a certeza de que o goleiro ia pegar, e pegou mesmo. Em outro jogo, quando estávamos empatados nos pênaltis, talvez pelo quinto ou sexto já batidos, o Caetano conseguiu defender um, pegou a bola e bateu o seguinte, fazendo gol, e comentou “não podia arriscar”.
Em um campeonato entre escolas o time do meu neto atuou muito bem e, especialmente na final, ele fechou o gol, com a vitória por 3 a 2. Na saída, um jogador do time adversário reclamava para o pai sobre a fragilidade de seu time, quando, com a tranquilidade de quem foi jogador de futebol profissional bem sucedido, o pai o interrompeu afirmando: “ganhou o time que jogou melhor”. E, passando pela gente, retornou se dirigindo a meu neto e exclamou: “Caetano, você é um monstro”.
Com seus 15 anos, continua se recusando a jogar no campo, ele gosta mesmo do futsal, defendendo, armando jogadas e fazendo gols. O avô nunca perde um jogo, e, quando possível, levando a maior torcedora desse goleiro, sua irmã Leona, com 9 anos. Um dia desses, em um time novo com o qual ainda não havia jogado, e nem mesmo treinado, fomos derrotados por 5 a 1. Só que o nosso goleiro foi mais aplaudido que todos os gols marcados pelo adversário. No finalzinho do jogo, Caetano fez uma ponte, pelo alto e impedindo um gol feito, e foi aplaudido por todo mundo, inclusive pela torcida adversária. A Leona definiu: “perdemos, mas com estilo”.
O jogo seguinte, alguns dias depois, pelo mesmo time e sem treino, foi um espetáculo. Nosso goleiro fechou a meta, armou jogadas, saiu tocando a bola, mas, ao final do primeiro tempo, tomou um gol indefensável. No segundo tempo, o goleiro-linha saiu, driblou e fez o primeiro gol. Logo depois, em poucos segundos, o time, confiante, marcou o segundo. Fechamos com a virada de 2 a 1, com participação absoluta do goleiro. Foi um espetáculo e sortudos foram os que assistiram.